sábado, março 05, 2005

Sábias palavras



A entrevista abaixo eu recebi pela internet , achei du caralho e apesar de ser só um pedacinho , vale dar uma lida ( Claro que vale dar uma lida é o Ugo Giorgetti , porra !!)

"Reproduzo aqui, com a devida autorização dos responsáveis pela Revista E, do SESC / Av. Paulista, um trecho da entrevista com o diretor, produtor e roteirista Ugo Giorgetti. Nela, o diretor de Os Boleiros, Quebrando a Cara, etcetal, expende idéias e pontos de vista que primam pelo bom senso, lucidez e inteligência. Infelizmente, o espaço virtual disponível em nosso Informativo não permite que a entrevista seja reproduzida na íntegra, como seria o ideal. A entrevista toda está na Revista E, de fevereiro de 2005. Aí vai um “trailer”."



Revista E - Com a constante menção de filmes brasileiros concorrentes ao Oscar, você diria que o cinema brasileiro corre o risco de ficar dependente de um grande esquema internacional de produção?

Giorgetti - Eu não vejo futuro nenhum nisso. Acho um grande escândalo. O cinema brasileiro atravessa uma fase negra, absurda, totalmente inconcebível em qualquer país sério do mundo. Não vou citar a França, nosso espelho maior, porque estamos a centenas de anos-luz daquele país, em termos de legislação de cinema e de ordenação jurídica da própria comunidade cinematográfica. Mas posso falar da Argentina, por exemplo que é nossa “rival” - o Galvão Bueno vive incitando a gente a odiar os argentinos. Na Argentina, existe uma lei de cinema muito melhor. E melhor para quem? Para o cinema independente. No Brasil, a situação é, na minha opinião, indecente. Há gente fazendo cinema para agradar aos grandes estúdios de Hollywood ou à TV Globo. É importante a gente entender que nenhuma dessas empresas estrangeiras que estão produzindo ou coproduzindo determinados filmes no Brasil, nem a Warner, nem a Columbia, nem a Fox trabalha com dinheiro próprio. Elas trabalham com o dinheiro dos incentivos fiscais. Só que essas multinacionais incentivam o contrário. Claro que negam isso com uma série de argumentos, tentando provar, por meio de sofismas, que não trabalham com dinheiro público. Então faço uma simples pergunta: se elas não trabalham com dinheiro público, por que só começaram a trabalhar quando saíram as leis de incentivos fiscais? Esse súbito acesso de brasilidade, de fazer filmes no Brasil, que, de repente, acometeu essas multinacionais, se deu a partir do momento em que, coincidentemente, o governo prmitiu que elas passem a usar dinheiro dos impostos. A Globo Filmes, por exemplo, não existia antes disso. E a Globo Filmes diz que não usa dinheiro público...



REVISTA E - Um dos projetos da Ancinav era desmantelar esse esquema?

Georgetti - Era ordenar um pouco. Era fazer com que o dinheiro do cinema viesse do próprio cinema. Que é que acontece na Argentina? Lá, o dinheiro do cinema, 10% de cada ingresso, vai para o Instituto Nacional del Cinema y Artes Audiovisuales, ou seja, para o próprio cinema argentino. Não vem da Nestlé, da Brahma etc., o que é ridículo, absurdo, uma coisa grotesca. Você tem de ir falar com um empresário, para ele te dar dinheiro para fazer um filme, quando ele faz cerveja, panetone, carro... O cara tem mais é de fazer panetones, carros e cervejas. Não filmes. O projeto da Ancinav visava, entre outras coisas, que aqui também fosse assim como na Argentina. Como? Por meio de taxas. Que taxas? Taxas cobradas dos exibidores, da televisão. Na Argentina, isso bastou.



REVISTA E - O que você pensa da intervenção do governo? (N.R.: A pergunta refere-se à intervenção do estado no cinema e, em especial, na tevê)

GEORGETTI - Eu acho que está mais do que na hora de o governo entrar no conteúdo das televisões. A própria tevê, na minha opinião, faz uma grande confusão na cabeça das pessoas, insinuando que se trata (N.R.: Georgetti se refere à intervenção estatal) de um governo tirânico e que pretende dirigir a opinião pública como se houvesse uma ditadura. Primeiro, o governo é legitimamente eleito pelo povo. Portanto, seríamos nós que estaríamos intervindo na tevê, via governamental; nós, a sociedade que elegeu esse governo. Então não há nada de ditatorial nisso. O que acontece na televisão brasileira hoje é um escândalo público. Nós praticamente não temos educação formal no Brasil, as escolas faliram. Quem transmite educação para a molecada, para as gerações brasileiras, é a televisão, e transmite isso que aí está. Agora, se você pegar a programação de televisão, vê logo que é um crime o governo não interferir. Eu acho que todo presidente do Brasil, futuramente, vai ser responsabilizado por esse crime de deixar Sílvio Santos e não sei mais quem, religião não sei de quem, instruir a população brasileira. Salvo algumas exceções na área da dramaturgia, tem na Globo lixo como o Faustão, a Xuxa, o diabo a quatro. E agora vão dizer que o Estado não pode interferir na opinião... Isso não é opinião coisa nenhuma. Esse conteúdo é lesivo, é um absurdo, é uma coisa degradante.



REVISTA E - Mas joga-se com a idéia de censura, de ditadura...

GIORGETI - Claro. Censura, ditadura, é quatro pessoas determinarem o que o povo brasileiro todo vai ver na televisão. Isso é que é ditadura. Nós temos uma ditadura de quatro: Sílvio Santos, a Record, a Bandeirantes e a Globo. A Rede TV! eu nem conto porque não sei o que é. Tudo bem, talvez ditadura de cinco pessoas, se você quiser. É o fim do mundo. Televisão, do jeito que existe no Brasil, não existe em país nenhum. O poder que essa gente tem de determinar até os valores... Você vê criança de cinco anos imitando gente da televisão. Eu não estou dizendo que você deve fazer uma tevê moralizante, nada disso. Mas que se faça uma televisão inteligente, que permita ao público optar, que dê várias visões de cultura. Por que eles só apresentam um tipo de música? Um só tipo de dramaturgia? Um só tipo de pensamento?

Nenhum comentário: